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Por que o Real forte é bom para a economia



Flávia Lima e Denize Bacoccina, IstoÉ Dinheiro


Os benefícios do dólar barato espalham-se pela economia: inflação baixa, maior poder de compra dos consumidores no mercado interno, atração de investimentos e expansão das multinacionais brasileiras no Exterior

Para Nathan Blanche, sócio da consultoria Tendências, os fundamentos da economia justificam o nível atual do real, importante no processo de ajuste da inflação à meta. Acompanhe a entrevista exclusiva em vídeo abaixo:

A luz amarela voltou a piscar nos monitores da área de câmbio do Banco Central (BC) na terça-feira 14. A cotação do dólar, pressionada por uma desvalorização global, voltou a cair diante do real. Mais uma vez, os operadores do BC compraram alguns milhões de dólares do mercado para suavizar a tendência de queda da moeda americana. Pela décima sessão consecutiva, o dólar derreteu e fechou um pouco acima de R$ 1,70, o menor nível dos últimos dez meses.

Enquanto tudo isso acontecia, vários negócios importantes foram fechados dentro e fora do País: o empresário André Gerdau Johannpeter acertou os últimos detalhes para a compra da siderúrgica Tamco, nos Estados Unidos, por US$ 165 milhões; o presidente da Lupatech, Nestor Perini, autorizou a aquisição de 7% da espanhola Vicinay Marine, por E 12,5 milhões; e o subsecretário de dívida pública do Tesouro, Paulo Valle, bateu o martelo numa captação externa de US$ 550 milhões, pagando a investidores americanos, europeus e asiáticos uma taxa de retorno de 5,2% ao ano, a menor da história para um papel do governo brasileiro. O que essas cenas significam A primeira conclusão importante é de que o Brasil mudou para melhor nos últimos anos e isso está se refletindo diretamente em sua moeda.

Uma pequena viagem no tempo basta para entender essa nova musculatura monetária. Oito anos atrás, o dólar disparou para R$ 4 por causa dos temores de empresários e investidores estrangeiros com a eleição de um ex-metalúrgico para presidente da República. O risco-país foi às nuvens.

Mas o diabo não era tão feio, o País manteve a estabilidade conquistada com o Plano Real e deslanchou. Não só superou a crise global de 2008 como virou credor do Fundo Monetário Internacional (FMI). Hoje, a poucas semanas de novas eleições gerais, o Brasil atrai mais dinheiro do Exterior, os capitalistas locais compram empresas lá fora e o câmbio contraria a lei da gravidade dos escândalos políticos.

É inacreditável: na quinta-feira 16, dia em que a ministra mais forte do governo, Erenice Guerra, foi demitida da Casa Civil, o dólar caiu durante todo o dia e fechou estável, a R$ 1,718. Nada parece abalar o humor favorável dos estrangeiros com o Brasil. O risco do País virou oportunidade e a enxurrada de dólares continua.

Luís Afonso Lima: "O Brasil só tem a agradecer pelo real forte. As exportações representam apenas 15% do PIB"

Em 2010, as entradas superam as saídas de divisas em mais de US$ 5 bilhões. Somente com a mega-capitalização da Petrobras, que está em curso na bolsa, mais US$ 20 bilhões estão a caminho. O governo espera investimentos diretos estrangeiros de US$ 38 bilhões este ano. Tudo isso pressiona a cotação do dólar para baixo (a queda no trimestre é de quase 5%) e leva o Planalto a montar um plano de guerra para amenizar a pressão cambial.

Na quarta-feira 14, o ministro da Fazenda Guido Mantega avisou o mercado que vai atuar pesado na ponta compradora: Vamos enxugar qualquer excesso de dólar que possa entrar com a operação da Petrobras. Vamos comprar tudo, já estou avisando . Especula-se que as reservas do Fundo Soberano e as operações no mercado futuro de câmbio da BM&F poderão ser usadas para frear a alta do real.

Porém, essas armas são de alcance limitado. Até o office-boy da Fazenda sabe que o governo não tem cacife para mudar a tendência de queda do dólar, que é mundial. Dada a fraqueza da economia dos Estados Unidos e a pujança da brasileira, essa é uma guerra perdida. No máximo, o Banco Central pode atenuar a volatilidade com compras diárias no mercado à vista, como tem feito para reduzir a oscilação excessiva, o maior inimigo do comércio exterior.

André Gerdau: aposta redobrada nos Estados Unidos após a compra da siderúrgica Tamco por US$ 165 milhões

A taxa de câmbio em si não é o que mais nos preocupa. O mais importante é a estabilidade da moeda , diz Claudio Raupp, vice-presidente do grupo de computação pessoal da HP no Brasil. Os executivos do setor privado e do setor público sabem que ter uma moeda cada vez mais forte é inevitável para o Brasil atual. E isso é bom para a economia. Há mais ganhadores do que perdedores nesse processo, avaliam economistas e homens de negócios ouvidos pela DINHEIRO.

O Brasil só tem a agradecer pelo real forte , diz Luís Afonso Lima, presidente da Sobeet, entidade que reúne grandes multinacionais e estuda a globalização. Ele reconhece que a queda do dólar tem um impacto nefasto sobre a exportação de produtos industrializados. Cada centavo perdido reduz a força financeira e a capacidade de manter a competitividade e gerar empregos para os brasileiros, argumentam os defensores de uma taxa de câmbio depreciada. Pode ser, mas essa é somente uma pequena parte de uma história muito maior.

As exportações representam apenas 15% do PIB. Os outros 85% são favorecidos pelas vantagens do dólar mais barato, que aumenta o dinamismo do mercado interno e favorece o crescimento da economia , argumenta Lima. Um dos efeitos cambiais mais importantes é a ajuda das importações no combate ao maior vilão da economia brasileira de todos os tempos: a inflação.

O dólar mais barato favorece a importação de produtos acabados, componentes, insumos e máquinas que ajudam a segurar a alta dos preços, mantendo a inflação baixa. O IPCA, índice oficial de inflação, não deve passar de 5,2% em 2010 e 4,5% em 2011, menos da metade dos 12,5% registrados em 2002. Na prática, isso significa um poderoso aumento do poder de compra dos brasileiros, especialmente das classes C e D.

Nos últimos cinco anos, a massa real de salários cresceu 35%. Mais de 40 milhões de pessoas (uma Espanha) entraram no mercado de consumo no País. O imposto inflacionário diminuiu e sobrou mais dinheiro para o consumo , diz Maurício Morgado, especialista em varejo da FGV.

O que parecia impossível aconteceu: a demanda aumentou e os preços caíram. Não tem milagre. A oferta também cresceu, graças ao aumento das importações. Não surpreende, portanto, que o Brasil tenha atravessado bem a crise global de 2008 e 2009 com base no mercado interno e o PIB tenha voltado a crescer ao ritmo de 7,5% ao ano, uma das maiores taxas do mundo.

O lado bom do dólar mais barato é o controle da inflação, que é positivo para a sociedade brasileira como um todo , diz Luiz Carlos Aguiar, diretor-financeiro da Embraer. Nesse contexto, a queda do dólar tem outro efeito benéfico: diminui a necessidade de aumento de juros pelo Banco Central.

Tanto é que no começo do mês o BC manteve a taxa básica em 10,75%, cessando a alta prevista para o ano. Os números do setor automobilístico também derrubam a tese de que o real valorizado é vilão das exportações. Neste ano, pela primeira vez na história, o País encontrará um ponto de exato equilíbrio entre importação e exportação de veículos.

Segundo a Anfavea, entidade que representa as montadoras, serão embarcados 620 mil unidades para o Exterior, volume equivalente ao número de carros que serão importados. Apesar do câmbio em trajetória de queda, 2010 será um ano de recuperação. Em 2009, foram exportadas 485 mil unidades, cerca de 135 mil carros a menos do que a previsão deste ano. Houve uma visível reação dos mercados lá fora, o que nos ajudou a aliviar o impacto da queda do dólar , conta CledorvinoBelini, presidente da Anfavea e da Fiat.

Mesmo que as exportações estivessem em queda, não seria o fim do mundo para as montadoras. Os 620 mil carros que serão embarcados representam apenas 18% dos cerca de 3,4 milhões de veículos que serão produzidos neste ano. Outra razão para não reclamar do dólar está nas linhas de produção.

A desvalorização reduz o custo de importação de autopeças e amplia as opções de compra às montadoras. Atualmente, o índice de nacionalização dos carros produzidos no Brasil é de 80%. A indústria automobilística ainda é uma das mais protegidas. Veículos produzidos fora da zona de livre comércio pagam 35% de taxa de importação.

Removille, da França: governo de Nicholas Sarkozy oferece incentivos para atrair
investimentos diretos de companhias brasileiras, inclusive de médias e pequenas

A indústria de bens de capital não tem o mesmo tratamento. As importações de máquinas e equipamentos são taxadas a 14%. O setor atingiu em julho o maior volume de compras externas em 70 anos. De janeiro a julho, o déficit setorial atingiu US$ 8,5 bilhões. O que por um lado pode assustar, por outro é um bom sintoma.

As empresas brasileiras estão aproveitando o câmbio favorável para modernizar o parque industrial e melhorar a produtividade. Existem dois tipos de importação: a do bem e a do mal. A do mal é aquela que substitui a produção nacional por produtos fabricados em condições desiguais.

Já a do bem é aquela que estimula o empresário a investir na sua empresa, ampliando a capacidade produtiva e incorporando tecnologia. Isso tem acontecido bastante , compara o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Luiz Aubert Neto. Nessa disputa de forças, é melhor ir à luta do que ficar batendo no bordão da desindustrialização causada pelo câmbio valorizado.

Essa história de desindustrialização é choro de geração antiga que não pega. O nível de industrialização brasileiro é compatível com países desenvolvidos como Nova Zelândia, Austrália e a zona do euro , provoca o economista Natan Blanche, da consultoria Tendências. A Embraer, por exemplo, é uma das maiores exportadoras do País e tem bons motivos para se queixar da taxa de câmbio. Ela vende a maior parte dos aviões que fabrica em São José dos Campos (SP) para companhias estrangeiras e recebe em dólares quase 90% de suas receitas.

Como uma boa parte dos componentes também são importados, o dólar barato ajuda a reduzir custos. O problema é que cerca de 30% de suas despesas são pagas em reais e a valorização da moeda brasileira aumenta o peso dos custos locais no negócio final. Em vez de sentar e chorar, a empresa prefere compensar as desvantagens com o aumento da produtividade.

A receita é manter as despesas administrativas e produzir mais com menos, reduzindo desperdícios em todos os níveis da companhia. Não tem outro jeito. Temos que ser mais produtivos. A indústria brasileira tem que trabalhar desta maneira , afirma Aguiar. O mercado interno também tem ajudado a fabricante a aumentar suas receitas em reais. No ano passado, essa fatia representou 11% do total, principalmente por causa das encomendas das companhias Azul e Trip, especializadas em aviação regional, mercado-alvo da Embraer.

Os turistas brasileiros nunca viajaram tanto, não só no Brasil, como no Exterior outro benefício do dólar barato. O País inseriu-se na economia global, enviando executivos para estudar e trabalhar lá fora, e os empresários foram às compras. Depois de investir US$ 4,6 bilhões em participações estrangeiras em 2009, este ano enviaram mais US$ 14,6 bilhões até julho.

Desde 1999, quando arrematou a Ameristeel nos Estados Unidos, a Gerdau já comprou 24 empresas em outros mercados. A Camargo Corrêa Cimentos investiu US$ 3,4 bilhões no Exterior desde 2005. Este ano, depois de elevar para 33% a sua participação no capital da cimenteira portuguesa Cimpor, prepara-se para crescer em Angola.

É preciso musculatura internacional até para competir no mercado interno, explica Ricardo Barbosa, diretor da área de Cimentos do Grupo Camargo Corrêa. O mercado de cimento no Brasil cresceu para 58 milhões de toneladas. Nos últimos cinco anos, o dos Estados Unidos caiu para 60 milhões.

Já somos um dos maiores mercados do mundo , compara. A Weg, fabricante catarinense de motores, também saiu às compras e, neste ano, adquiriu a sul-africana ZestGroup e assumiu o controle acionário da Voltran, no México. A empresa já tem uma forte presença global e com as aquisições estamos fortalecendo essa atuação , diz o diretor Laurence Beltrão Gomes.

De olho no crescente apetite dos capitalistas brasileiros por incursões na Europa, os governos da França e da Holanda acabam de abrir filiais de suas agências de promoção de investimentos diretos no País.

Na quarta-feira 15, o francês François Removille encontrou-se com um pequeno empresário em São Paulo para explicar as vantagens de se investir na França, cujos incentivos fiscais atraíram grupos como Embraer, Natura e Alpargatas. As empresas de pequeno e médio porte também pensam em se internacionalizar , diz ele. Ter moeda forte dá nisso.

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